Alguns conseguem dizer muito sobre outras pessoas atráves da leitura de mãos, astrologia ou hipnose. Eu consigo falar de alguém se visualizar o seu cachorro. Parece engraçado, mas é verdade pura, crua e canina: O cachorro que você tem, diz muito sobre você. E isso tem a ver mais com o aspecto do cão, do que com a raça dele, pois os donos conseguem enfeiar ou embelezar seus cães proporcionalmente a sua própria feiura ou beleza. E costumam dar seu toque especial como lacinhos da sua cor predileta, roupinhas que consideram bonitinhas, e parecidissimas com a suas próprias, embora isso eles não percebam, e assim por diante. Ou seja, eles adaptam o cachorro ao seu estilo próprio. E não somente na moda, mas também ao seu estilo de vida, e inclusive, a sua fisionomia. Isso mesmo: os cachorros adquirem em determinado periodo de tempo, caracteristicas fisicas muito similares as do dono. É muito estranho imaginar que aquele buldogue que o seu vizinho tem, possui similaridades físicas com ele, mas quando você ver os dois juntos, caminhando lado a lado na rua, irá notar as semelhanças. E vai achar muito engraçado. E viciante, é claro. Eu, por exemplo, sou um viciado consciente, pois não consigo andar na rua sem notar essas semelhanças, e comentar com quem quer que esteja comigo: “Aquele cachorro é dela. Olha só como os dois são parecidos. Olha a o nariz do cão e o dela, não são iguais??”, ou, “Olha como aquele cachorro é parecido com ele! Os dois tem o mesmo jeito de andar!” Mas aposto que você deve estar pensando: e quando alguém está passeando com um cão e não encontra-se nenhuma semelhante entre eles? Bom, nesse caso pode ter certeza que o cachorro não é da pessoa. Pode ser o marido levando o cachorrinho da esposa para passear, o sobrinho levando o cachorro da titia, o pai levando o cachorro da filhinha ou alguém contratado com essa função. Sempre há uma explicação para a falta de semelhança, pois ao meu ver, a semelhança entre ambos já é item obrigatório de série.
Aposto que após você ler isso vai começar a notar mais os cães e seus respectivos donos, olhá-los com um olhar crítico e fazer algumas constatações. E caso você ainda não tenha um cachorro, quando tiver, provavelmente irá cuidar da aparência dele. Se já tem, deve estar apenas esperando terminar de ler esse texto para ir procurar no google a pet shop mais perto da sua casa para dar um trato no seu cão (com muito bom gosto, é claro), pois de forma alguma quer que alguém faça uma análise errada de vocês.
sexta-feira, 8 de outubro de 2010
segunda-feira, 20 de setembro de 2010
Previsibilidade versus Gosto
Estava esses dias em um restaurante acompanhado de uma amiga e fui me servir de sobremessa. Foi só o tempo dela gritar:
- Eu não acredito que tu vai te servir de salada de frutas de novo!
- Sim, é a minha sobremessa preferida. E se não fosse salada de frutas seria gelatina...
Tive que ver um saudoso virar de olhos acompanhado de um balançar de cabeça:
- Tu é muito previsivel, sempre se serve da mesma coisa. Olha quantos doces deliciosos tem por aqui...
Ela estava certa quanto aos doces, mas errada quanto ao julgamento: Afinal, onde fica o meu livre arbitrio de escolher a minha própria sobremessa? Será que não passou pela cabeça dela que eu não possa gostar daqueles doces tanto quanto eu gosto de gelatina ou salada de frutas? Não acredito que meu caso seja de "previsão", mas sim, de "gosto". Afinal, quantas pessoas largam tudo o que estão fazendo para olhar tv? Ou melhor: quantas pessoas deixam de fazer qualquer outra coisa para ficar assistindo tv? Ou ficarem conectadas na internet, ao invés de dar um passeio num dia ensolarado? Elas não são previsiveis, mas possuem uma preferência específica. Cada um escolhe aquilo que lhe parece melhor. Por exemplo, quando vou escrever gosto de usar a fonte times (apenas ao escrever, não ao postar). Muitas pessoas que eu conheço detestam usar, mas eu prefiro. Gosto de usar porque me agrada ao escrever enxergar letras com serifas. Essa é a razão. E para esse ser o meu motivo, não é necessário que alguém sinta a mesma necessidade das serifas que eu sinto, ou consiga perceber o que eu percebo; Não é porque alguém não entende, que eu esteja dando uma falsa justificativa ou que ela não seja admissível. É como gostar de ler determinado autor, e a pessoa não compreender porque diabos você não lê aquele outro. Me entendem?
Vou continuar com a minha salada de frutas e gelatina: são mais naturais e já tenho certeza que são livres de quaisquer previsibilidades.
- Eu não acredito que tu vai te servir de salada de frutas de novo!
- Sim, é a minha sobremessa preferida. E se não fosse salada de frutas seria gelatina...
Tive que ver um saudoso virar de olhos acompanhado de um balançar de cabeça:
- Tu é muito previsivel, sempre se serve da mesma coisa. Olha quantos doces deliciosos tem por aqui...
Ela estava certa quanto aos doces, mas errada quanto ao julgamento: Afinal, onde fica o meu livre arbitrio de escolher a minha própria sobremessa? Será que não passou pela cabeça dela que eu não possa gostar daqueles doces tanto quanto eu gosto de gelatina ou salada de frutas? Não acredito que meu caso seja de "previsão", mas sim, de "gosto". Afinal, quantas pessoas largam tudo o que estão fazendo para olhar tv? Ou melhor: quantas pessoas deixam de fazer qualquer outra coisa para ficar assistindo tv? Ou ficarem conectadas na internet, ao invés de dar um passeio num dia ensolarado? Elas não são previsiveis, mas possuem uma preferência específica. Cada um escolhe aquilo que lhe parece melhor. Por exemplo, quando vou escrever gosto de usar a fonte times (apenas ao escrever, não ao postar). Muitas pessoas que eu conheço detestam usar, mas eu prefiro. Gosto de usar porque me agrada ao escrever enxergar letras com serifas. Essa é a razão. E para esse ser o meu motivo, não é necessário que alguém sinta a mesma necessidade das serifas que eu sinto, ou consiga perceber o que eu percebo; Não é porque alguém não entende, que eu esteja dando uma falsa justificativa ou que ela não seja admissível. É como gostar de ler determinado autor, e a pessoa não compreender porque diabos você não lê aquele outro. Me entendem?
Vou continuar com a minha salada de frutas e gelatina: são mais naturais e já tenho certeza que são livres de quaisquer previsibilidades.
domingo, 19 de setembro de 2010
A intolerante - Estórias de Psicólogos # 1
– Como assim não tem jeito?
Nunca imaginei ouvir isso de você. Eu faço terapia a tanto tempo que acredito merecer mais compreensão pelos meus problemas. Afinal, graças a eles é que eu estou aqui e pago todo santo mês a gorda conta pelo meu desequilibrio. Você nunca me respondeu nesse ar de desdem, nesse ar de “foda-se sua cretina, cada um com sua vida”. Me diz que não há jeito, que o que esta feito, esta feito, azar é o meu e ponto final. Você nem tem mais aquele olhar complacente. E onde estão as palavras otimistas e motivadoras? Você está tão azeda quanto uma laranja verde, que parece ter dormido com os pés destapados. Ou não deu. Mas tudo bem, se você não deu, não deu, eu até entendo, já me senti assim diversas vezes por não ter dado, mas bem que podia ao menos terminar de me escutar! Eu tô precisando desabafar cara!
– E eu acho melhor você dar o fora daqui.
Dar o fora daqui? Como assim? Isso é jeito de falar?? A sessão acabou de começar e você acabou de acabar? Que história é essa? Ai, ai,ai, acho que você não está muito bem mesmo. O que houve? Quer me contar? Desabafa comigo, talvez eu possa te ajudar, não é? Inversão de papéis não é o meu forte, mas eu posso abrir uma excessão para você...
- Não aguento mais ouvir você falar qualquer coisa que seja.
Bom, queridinha, nessa caso fica dificil. O que está acontecendo? Que bixo te mordeu? Olha, vou começar a levar a sério essas coisas, e desse jeito nunca mais volto aqui mesmo, viu? Mas deixe me ver, você está bem diferente... É o cabelo, né? Corte novo, ta na cara! Mas.... quem é essa criatura que finje que corta? Digo, acho melhor você mudar de cabelereiro, e tenho que te confessar que eu também ficaria meio amargurada caso fizessem isso comigo... Ele deve trabalhar numa pet shop, porque você está parecendo um poodle. Ou uma ovelha...
- Tenha uma boa tarde.
Perai, eu não disse que ia embora, não fica me cortando desse jeito. Além do mais ainda temos meia hora. E já que está de pé, aproveita e me busca um cafezinho por favor? Como assim, você não é minha empregada? E você não irá me trazer nem um copo d`água? Água não se nega a ninguém viu, minha vó já dizia isso... Sim, sim, mas é que eu tô precisando terminar de falar, pombas! Tô com a coisa intalada na garganta e não consigo colocar pra fora porque você não me deixa falar! Não, eu não vou vomitar no teu tapete Persa, não é isso que eu quis dizer... Bom, se você prefere ficar de pé tudo bem, eu não me importo. Mas pelo menos fica atrás da mesa, se ficar de pé na porta aberta igual um dois de paus vou começar a ficar ansiosa e com torcicolo de ficar com o pescoço virado. Estou começando a achar que você quer mesmo que eu vá embora. Como assim você quer mesmo? Como assim "até que enfim você percebeu isso"? Alguma coisa aconteceu para você estar me tratando dessa forma, não é? Me conta de uma vez, que eu prometo ir embora e nunca mais falamos sobre isso, ok? Ah... você trocou de profissão... é isso? Eu devia ter desconfiado... Bom, então já vou indo mesmo... muito obrig... mas que vaca! Fechou a porta na minha cara! Fez bem ter trocado de área, nunca gostei do trabalho dessa ordinária mesmo...
Nunca imaginei ouvir isso de você. Eu faço terapia a tanto tempo que acredito merecer mais compreensão pelos meus problemas. Afinal, graças a eles é que eu estou aqui e pago todo santo mês a gorda conta pelo meu desequilibrio. Você nunca me respondeu nesse ar de desdem, nesse ar de “foda-se sua cretina, cada um com sua vida”. Me diz que não há jeito, que o que esta feito, esta feito, azar é o meu e ponto final. Você nem tem mais aquele olhar complacente. E onde estão as palavras otimistas e motivadoras? Você está tão azeda quanto uma laranja verde, que parece ter dormido com os pés destapados. Ou não deu. Mas tudo bem, se você não deu, não deu, eu até entendo, já me senti assim diversas vezes por não ter dado, mas bem que podia ao menos terminar de me escutar! Eu tô precisando desabafar cara!
– E eu acho melhor você dar o fora daqui.
Dar o fora daqui? Como assim? Isso é jeito de falar?? A sessão acabou de começar e você acabou de acabar? Que história é essa? Ai, ai,ai, acho que você não está muito bem mesmo. O que houve? Quer me contar? Desabafa comigo, talvez eu possa te ajudar, não é? Inversão de papéis não é o meu forte, mas eu posso abrir uma excessão para você...
- Não aguento mais ouvir você falar qualquer coisa que seja.
Bom, queridinha, nessa caso fica dificil. O que está acontecendo? Que bixo te mordeu? Olha, vou começar a levar a sério essas coisas, e desse jeito nunca mais volto aqui mesmo, viu? Mas deixe me ver, você está bem diferente... É o cabelo, né? Corte novo, ta na cara! Mas.... quem é essa criatura que finje que corta? Digo, acho melhor você mudar de cabelereiro, e tenho que te confessar que eu também ficaria meio amargurada caso fizessem isso comigo... Ele deve trabalhar numa pet shop, porque você está parecendo um poodle. Ou uma ovelha...
- Tenha uma boa tarde.
Perai, eu não disse que ia embora, não fica me cortando desse jeito. Além do mais ainda temos meia hora. E já que está de pé, aproveita e me busca um cafezinho por favor? Como assim, você não é minha empregada? E você não irá me trazer nem um copo d`água? Água não se nega a ninguém viu, minha vó já dizia isso... Sim, sim, mas é que eu tô precisando terminar de falar, pombas! Tô com a coisa intalada na garganta e não consigo colocar pra fora porque você não me deixa falar! Não, eu não vou vomitar no teu tapete Persa, não é isso que eu quis dizer... Bom, se você prefere ficar de pé tudo bem, eu não me importo. Mas pelo menos fica atrás da mesa, se ficar de pé na porta aberta igual um dois de paus vou começar a ficar ansiosa e com torcicolo de ficar com o pescoço virado. Estou começando a achar que você quer mesmo que eu vá embora. Como assim você quer mesmo? Como assim "até que enfim você percebeu isso"? Alguma coisa aconteceu para você estar me tratando dessa forma, não é? Me conta de uma vez, que eu prometo ir embora e nunca mais falamos sobre isso, ok? Ah... você trocou de profissão... é isso? Eu devia ter desconfiado... Bom, então já vou indo mesmo... muito obrig... mas que vaca! Fechou a porta na minha cara! Fez bem ter trocado de área, nunca gostei do trabalho dessa ordinária mesmo...
sábado, 18 de setembro de 2010
Um encontro Fugaz
Dentre os guarda-sóis que se enfileiravam ao longo das areias brancas da praia, o dela destacava-se. Talvez, por seus detalhes nada convencionais - florido, com cores que abrangiam o laranja, roxo, rosa vivo, verde limão, e babados e mais babados. E não somente seu guarda-sol era atração nas areias daquela praia, como também, ela própria: moça, pele muito branca, cabelos vermelhos intenso, diversas tatuagens expostas, estrategicamente, por alguns locais de seu corpo mignon. Sem falar de seu maiô da década de 30, comprado, provavelmente, em algum brechó de Porto Alegre: o mais ousado de toda praia.
E foi nesse ínterim de sol e mar que ele tomou conhecimento dela; figura excêntrica perto das tantas outras que se alargavam ao seu lado com suas toalhas de praia espaçosas, guarda-sóis monótonos, biquínis minúsculos e cavados. Essa disparidade dela em relação ao restante das outras meninas que freqüentavam aquela praia, apenas acentuava seu fascínio. E então, ela se sentara, e após passar seu bloqueador solar, tirara de dentro da enorme ecobag um livro de algum autor cult. E em momento algum parecia interessada em pegar sol, ou jogar-se nas ondas daquele mar azul-quase-incolor; ao contrário, sua leitura mostrava-se mais interessante e viva que aquele fabuloso dia ensolarado. E enquanto todas as outras moças se esbaldavam no sol de escaldar, flertando com os rapazes que passavam, jogando acenos e sorrisinhos marotos, ela não dava a mínima para tudo aquilo: apenas em seu livro mantinha presa sua atenção.
E ele, que estava alguns poucos metros de distância, sentia uma vontade louca de puxar assunto com ela. Mas não o fazia, pois era um rapazinho tímido. E acreditava que seus óculos fundos de garrafa, seu corpo magro e desajeitado e sua sunga vermelha de vários verões, de forma alguma, o ajudariam para início de conversa. Sem saber, cultivava algo platônico: não amor, nem paixão, pois esses ainda desconhecia, mas uma grande atração. E essa atração platônica, era o que o fazia manter os olhos na figura notória que se estendia naquelas areias em pleno fim de janeiro. E era o que o fazia também, observar sutilmente ela virar as páginas do livro, com certa solenidade e precisão - e nem sequer uma piscada de olhos, ou um olhar de relance ela o dava. Nem ao menos parecia perceber sua insignificante presença. Na sua imaginação, sentia-se como um sapo, e ela, uma princesa de um reino distante.
E como é comum em dias de verão, o tempo fechou do nada e a chuva ameaçava cair em instantes. Mulheres, homens e crianças energicamente recolhiam suas tralhas, e rapidamente, a praia se esvaziava. E nessa agitação, apenas ele e a moça continuavam sentados, como se nada estivesse acontecendo. Quando as únicas figuras que se distinguiam entre as areias brancas e o céu cor de chumbo, eram ele e ela, a chuva começou a cair. Ambos, aos poucos, saiam do transe que se encontravam, quando sentiram a chuva fria desabar sobre eles. E, calmamente, a moça guardou seu livro e fechara seu guarda sol; e como por não ter-se algo mais a volta para enxergar, ela o viu. Diferente do que ele imaginava, ela não o repudiou, ao contrário, sorriu, ao mesmo tempo em que seus cabelos se agitavam ao vento, para em seguida, ficarem ensopados pela chuva que desandava; e ele vermelhou; e ela, com o sorriso convidativo ainda nos lábios, correu em direção as ondas, para logo após, lançar-se naquele mar intenso e agitado. E sem pensar, ele correu atrás, e também entrara no mar de águas frias, mas não a achou. E tentou de todas as formas encontrar aquela figura única que facilmente notaria dentre o azul marinho que o envolvia; e sem perceber, distanciava-se cada vez mais da orla. Até que em determinado momento, seus braços e pernas cansaram; e percebera ter nadado tanto, que nem conseguia avistar mais a praia. De repente, sentiu algo envolto em seu pé, e esse algo, puxava-o para o fundo; e desesperadamente se afogava. Com seus braços finos tentava subir à superfície, mas a cada frustrada tentativa, novo gole de água engolia. Até que sem mais forças para continuar, e certo de seu fim, desistiu, e afundou na profunda escuridão do mar. Concomitantemente, um grito apavorado saiu de sua garganta, fazendo todos a sua volta olharem assustados. Não sabia o que tinha acontecido: a pouco estava se afogando, e agora, estava de volta a praia, estendido debaixo de seu guarda-sol, o corpo com insolação pelo sol que pegara. E a moça também continuava lá, agora, lançando-lhe um olhar de desaprovação. E não demorou muito para que ela se levantasse, colocasse seu livro dentro da ecobag, recolhesse seu guarda-sol colorido e fosse embora. E ele, com o corpo ardendo, e ainda se recompondo do pesadelo que tivera, pensara, que assim, realmente, fora melhor para ambos.
E foi nesse ínterim de sol e mar que ele tomou conhecimento dela; figura excêntrica perto das tantas outras que se alargavam ao seu lado com suas toalhas de praia espaçosas, guarda-sóis monótonos, biquínis minúsculos e cavados. Essa disparidade dela em relação ao restante das outras meninas que freqüentavam aquela praia, apenas acentuava seu fascínio. E então, ela se sentara, e após passar seu bloqueador solar, tirara de dentro da enorme ecobag um livro de algum autor cult. E em momento algum parecia interessada em pegar sol, ou jogar-se nas ondas daquele mar azul-quase-incolor; ao contrário, sua leitura mostrava-se mais interessante e viva que aquele fabuloso dia ensolarado. E enquanto todas as outras moças se esbaldavam no sol de escaldar, flertando com os rapazes que passavam, jogando acenos e sorrisinhos marotos, ela não dava a mínima para tudo aquilo: apenas em seu livro mantinha presa sua atenção.
E ele, que estava alguns poucos metros de distância, sentia uma vontade louca de puxar assunto com ela. Mas não o fazia, pois era um rapazinho tímido. E acreditava que seus óculos fundos de garrafa, seu corpo magro e desajeitado e sua sunga vermelha de vários verões, de forma alguma, o ajudariam para início de conversa. Sem saber, cultivava algo platônico: não amor, nem paixão, pois esses ainda desconhecia, mas uma grande atração. E essa atração platônica, era o que o fazia manter os olhos na figura notória que se estendia naquelas areias em pleno fim de janeiro. E era o que o fazia também, observar sutilmente ela virar as páginas do livro, com certa solenidade e precisão - e nem sequer uma piscada de olhos, ou um olhar de relance ela o dava. Nem ao menos parecia perceber sua insignificante presença. Na sua imaginação, sentia-se como um sapo, e ela, uma princesa de um reino distante.
E como é comum em dias de verão, o tempo fechou do nada e a chuva ameaçava cair em instantes. Mulheres, homens e crianças energicamente recolhiam suas tralhas, e rapidamente, a praia se esvaziava. E nessa agitação, apenas ele e a moça continuavam sentados, como se nada estivesse acontecendo. Quando as únicas figuras que se distinguiam entre as areias brancas e o céu cor de chumbo, eram ele e ela, a chuva começou a cair. Ambos, aos poucos, saiam do transe que se encontravam, quando sentiram a chuva fria desabar sobre eles. E, calmamente, a moça guardou seu livro e fechara seu guarda sol; e como por não ter-se algo mais a volta para enxergar, ela o viu. Diferente do que ele imaginava, ela não o repudiou, ao contrário, sorriu, ao mesmo tempo em que seus cabelos se agitavam ao vento, para em seguida, ficarem ensopados pela chuva que desandava; e ele vermelhou; e ela, com o sorriso convidativo ainda nos lábios, correu em direção as ondas, para logo após, lançar-se naquele mar intenso e agitado. E sem pensar, ele correu atrás, e também entrara no mar de águas frias, mas não a achou. E tentou de todas as formas encontrar aquela figura única que facilmente notaria dentre o azul marinho que o envolvia; e sem perceber, distanciava-se cada vez mais da orla. Até que em determinado momento, seus braços e pernas cansaram; e percebera ter nadado tanto, que nem conseguia avistar mais a praia. De repente, sentiu algo envolto em seu pé, e esse algo, puxava-o para o fundo; e desesperadamente se afogava. Com seus braços finos tentava subir à superfície, mas a cada frustrada tentativa, novo gole de água engolia. Até que sem mais forças para continuar, e certo de seu fim, desistiu, e afundou na profunda escuridão do mar. Concomitantemente, um grito apavorado saiu de sua garganta, fazendo todos a sua volta olharem assustados. Não sabia o que tinha acontecido: a pouco estava se afogando, e agora, estava de volta a praia, estendido debaixo de seu guarda-sol, o corpo com insolação pelo sol que pegara. E a moça também continuava lá, agora, lançando-lhe um olhar de desaprovação. E não demorou muito para que ela se levantasse, colocasse seu livro dentro da ecobag, recolhesse seu guarda-sol colorido e fosse embora. E ele, com o corpo ardendo, e ainda se recompondo do pesadelo que tivera, pensara, que assim, realmente, fora melhor para ambos.
sexta-feira, 17 de setembro de 2010
Malditas Senhas
Não vou começar esse texto dizendo que poucas coisas me incomodam, mas sim que dentre as tantas coisas que me incomodam, uma delas consegue me deixar ainda mais furioso: senhas. Não quero dar dica alguma para nenhum ladrão de senhas bancárias, mas minhas senhas costumam ser iguais. Digo, tenho diversas palavras/códigos/números que uso como senhas para diversos acessos, e para muitos acessos elas são iguais. Já faço isso para facilitar minha curta memória, mas mesmo assim, não adianta: quem disse que eu não me esqueço delas? É passar um tempo e eu já não me recordo se a senha daquele site de relacionamentos é “x” ou “y”, do MSN é “z” ou “t”, ou do banco é “p” ou “s”. E lá vou eu, tentando todas as possibilidades existentes, criadas e esquecidas por mim. Bufando de raiva, mais tentando é claro. E tento, tento e tento, e às vezes, não dá em nada. E eu lá bufando como um touro epilético. Esse foi o caso da minha senha do Orkut, que eu tentei tudo o que eu conseguia lembrar, e somente após um mês de milongas, é que me lembrei da bendita. Até então só acessava em alguns instantes no meu serviço, pois lá meu computador bonzinho fez questão de armazená-la, e no rápido momento em que digitava a primeira letra do login – sim, meu esquecimento é entre senhas, não logins – tudo acontecia. Sem falar que existem outros tipos odiáveis de senhas: as que espirram, (sim elas “espirram” pois é passar o prazo definido e atttccchhhimmm, elas espirraram e vão pro além) e as de três tentativas e tu se fode. Tu vai lá com toda a pose e tenta uma, errou e se preocupa, tenta a segunda, se apavora e arregala os olhos, tenta a terceira, errou, se fudeu, e grita: Nãoooo acredito que bloqueie meu cartão de novoooooo!
Depois da maldição das senhas que nos cercam, somente nos tornarmos escravos de alienígenas deve ser pior...
Depois da maldição das senhas que nos cercam, somente nos tornarmos escravos de alienígenas deve ser pior...
sexta-feira, 6 de novembro de 2009
O Ingênuo
Jussara é do tipo de mulher que diversos homens já ouviram falar, e que diversas mulheres a odeiam sem mesmo saber sua origem. Jussara gosta de aproveitar a vida; é do tipo de moça namoradeira: dia está ficando com um; dia está se amassando com outro, não é mulher de ficar sozinha. No grupo de amigos de Nando, todos a conhecem, e alguns já tiveram a oportunidade de ter algo com a moça. Dessa forma, não era surpresa quando um dos membros do grupo chegava e falava que ficou com a Jussara no final de semana, e é claro, abria os detalhes mais íntimos a todos. Entre aqueles que já pegaram - é assim que se referiam - também era comum fazerem comparações; e entre os que a pegaram e os que ainda não a pegaram, era normal fazerem apostas de quem seria o próximo a pegar. Mulher fácil, todos no grupo a consideravam, menos o Nando.
E assim, quando Jussara começou a se engraçar por Nando, ninguém se surpreendeu, afinal, ela se engraçava por todos. Mas a surpresa foi que ela não queria desgrudar dele, da mesma forma como fez com todos os outros. Embora namoradeira, Jussara, é uma mulher bonita e atraente, e ninguém entendia o que ela viu em Nando: ele, um rapaz baixinho e quase careca, míope, que fica nervoso quando fala com uma mulher, que, realmente, não tem beleza física alguma. Então, o que afinal, despertou a atenção dela?
Isso se ela estiver interessada de verdade, um dos amigos comentou quando Nando não estava entre eles. Todos conheciam a fama que ela possuía, ninguém podia dizer o contrário. Era estranha aquela aparente mudança repentina dela, menos Nando enxergava isso. E quando eles tentavam o advertir, dizendo para ir com calma, que ela não era o tipo de mulher para se envolver, ele dizia: Bobagem pessoal. Ela realmente gosta de mim, e eu dela. Nada demais. Os amigos começaram a ficar preocupados quando Nando dissera gostar dela. Não queriam ver aquela mulher fazer o amigo deles se dar mal, e sabiam, hora ou outra, ele se daria.
E assim, o tempo passou, e os dois começaram a namorar sério. Todos ficaram de queixo caído quando Nando, em uma das tantas reuniões com os amigos, contou a novidade. E assim foi: algum tempo depois estavam noivos; alguns meses após o noivado, já estavam casados. Ele estava visivelmente apaixonado, e ela, mudada da água para o vinho, quase uma santa. Dizia que amaria seu docinho até o final da vida dela, e assim, com seus trejeitos faceiros, ajeitava seu decote.
Casaram-se e ele comprou um apartamento em um bairro nobre de Porto Alegre; Ele, que já tinha seu carro, comprou um para ela não precisar depender mais de ônibus para ir pro serviço; Na lua de mel foram para o Tahiti; Após algum tempo, ele abriu para ela sua própria estética; Fora todas as roupas, sapatos, bolsas e jóias caríssimas que ele á dava. Sim, ela era uma mulher de grande sorte.
Certo dia, ao chegar em casa mais cedo, encontrou Jussara com um dos seus amigos, fazendo sala, cozinha e quarto - aquele mesmo que duvidara se ela realmente estava interessada em Nando ou não. Pois que a briga foi feia: ele mandou o ex-amigo embora antes que perdesse a cabeça, e após discutir, também pôs a safada para fora de casa, somente com a roupa do corpo. E assim, se divorciaram. No final das contas, ele ainda teve que vender o apartamento que comprou, e dividir com ela; a estética e o carro, desde o começo estavam no nome dela; e, ainda por cima, teve de começar a pagar pensão para a moça, pois ela estava grávida dele quando foi embora...
Hoje em dia Nando aprendeu a selecionar suas amizades; a conhecer mais as mulheres com que se relaciona; a ser pai; a não gastar tanto de seu dinheiro, e o principal: a deixar de ser ingênuo.
quarta-feira, 21 de outubro de 2009
Esquecida
Era uma mocinha muito bonitinha, mas tinha um problema: era esquecida. Esquecia de apagar as luzes, de pagar a conta de água, de guardar os livros, da comida no fogo e do leite no micro, do celular em algum lugar, do nome de filmes, do ritmo de músicas, da chave de casa pelo lado de dentro, de onde havia estacionado o carro no shopping, do cartão do banco, das reuniões semanais da empresa, dos aniversários de amigos, de tirar as lentes à noite, das consultas com o dentista, de tomar a pílula, de visitar seu irmão, que é alérgica a tomate, de pôr o despertador para despertar, de anotar na agenda os compromissos, de pagar a diarista, de retornar as ligações, das provas da faculdade, de comprar velas, de beber moderadamente, de ler o jornal, de onde pusera os óculos, canetas e cd’s... Enfim, ela se esquecia de tudo, e não era proposital seu esquecimento, apenas fora uma única vez; quando ela “se esquecera” do noivo no altar da igreja, e aproveitou sua fama de esquecida, para tirar proveito da situação.
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